27 de junho de 2011

Teorizando o amor: Força forte - Retrato I

Bernardo sempre foi cheio das teorias. Após elaborar um pouco mentalmente, começou a contar sobre uma delas para Carol. Deitados no sofá, debaixo de um cobertor, ele olhava para fora procurando as palavras em meio à chuva silenciosa que pintava o vidro da janela.
Há 40 anos, a cromodinâmica quântica descobriu que os opostos não se atraem tanto quanto os iguais. Há dois dias, eu descobri que os opostos não se atraem tanto quanto os iguais. Foi em uma aula de física, em uma aula estranha. Percebi um paralelo entre a física nuclear e os relacionamentos.
O professor falava da tal "força forte". Na física, há basicamente quatro forças: Força gravitacional, força eletromagnética, força fraca e força forte. Todos os fenômenos da natureza estão ligados a uma dessas forças. A força forte me chamou a atenção. No colégio, estudamos apenas a gravidade e um pouco de eletromagnetismo. Esta ensina que corpos com cargas elétricas inversas se atraem, e corpos de mesma carga elétrica se repulsam. Isso levou algumas pessoas a acharem que na vida o mesmo acontecia, pessoas diferentes é que se atraíam. Porém, acho que é hora da outra força mostrar-se. A força forte tem uma intensidade bem maior que a eletromagnética. Obviamente, opostos se atraem, mas não na mesma proporção que os iguais, como mostra a força forte.
O paralelo é que uma delas é como a paixão carnal, que age em distâncias maiores, atraindo os opostos. A outra é como o amor de grande cumplicidade, que se aplica apenas em escalas microscópicas, atraindo os iguais.
Ora, se cargas elétricas iguais se repelem, como ficam unidos os prótons nos núcleos atômicos, já que estes têm a mesma carga positiva? Aí entra a força forte. Se ela não existisse, não existiria núcleo atômico, não existiria átomo, não existiríamos, não existiria amor. Ela consegue unir duas cargas idênticas, seu nome não é à toa, ela é forte! Sua ação começa a existir quando a distância entre as cargas iguais, fica menor do que 10-13 centímetros. Para se chegar a essa mínima distância tem que haver um esforço, há necessidade de entrega, de confiança, de alegria. Acho que é a distância entre dois corações que se amam, acho também que é especificada por Deus em algum momento da criação. A partir dessa medida, qualquer esforço para separação destas cargas, exije quantidades astronômicas de energia. Sua separação causa grande liberação de energia, é o que acontece em algumas bombas atômicas, a separação do núcleo atômico deixa sinais irreversíveis.
Você tanto fala que “os opostos se distraem, os dispostos se atraem”. É isso eu acho. Nós nos dispusemos. Você titubeava e eu me aproximava, sem pressa, sem causar turbulências em seu núcleo, até nos transformarmos em um único. Afinal já éramos iguais, nos tornamos idênticos. Aos poucos fomos nos aconchegando em nosso núcleo, até chegar naquela distância mínima. Essa força forte não envelhece ou acaba, então a ideia é não deixar que energias externas separem esse núcleo, algumas vão tentar, é assim que funciona a natureza, mas não se esqueça, nós temos a maior das forças, a força forte, o amor. Somos como um núcleo de hélio, dois prótons dividindo o mesmo espaço, coesos e unidos harmoniosamente... Somos iguais em nossas diferenças.
Bernardo parou de repente quando deixou os respingos de água na janela e observou Carol, já com uma lágrima suspensa em seus rasos olhos castanhos, ela o fitava. Não sendo muito afeito a emoções ele retomou:
— Então tudo é uma questão de física teórica, eu só concluí isso, porque a gente vive isso...
Carol o interrompeu em um rápido gesto. Seu dedo indicador, verticalmente, encostou-se aos lábios de Bernardo, como que pedindo silêncio. Ele suspendeu a fala e com o dorso da mão enxugou a lágrima dela que teimava em não descer. Ela tomou fôlego, deixando enfim outra lágrima molhar seu rosto de expressão contente e disse de uma vez só:
— Eu adoro o jeito como você fala da vida, eu adoro o jeito como você teoriza nosso amor, eu adoro o jeito como você me fala do seu mundo, eu adoro o jeito como você me ama. Das coisas que entendi me restaram duas. Sim, temos a força forte. Sim, somos iguais em nossas diferenças. Eu te amo, Bernardo!
Um breve silêncio gélido findou-se quando a lágrima de Carol, encontrou o sorriso contido de Bernardo, em um estalado beijo sob as pinturas da chuva na janela, agora finalizadas.

7 de junho de 2011

Obrigado, Ronaldo!

Hoje um dos maiores casos de triângulos amorosos acabará com um apito. Pelo menos nos gramados famosos do mundo futebolístico. Ronaldo, bola e rede. Os três juntos são sinônimo de gol, de euforia. Um amor incondicional, visível até para os que não são amantes do futebol. Não sei bem se é um triângulo, está mais para círculo amoroso. Amor mútuo entre bola e Ronaldo, entre bola e rede. Um carinho quase maternal desde 1993, quando Ronaldo, foi entregue ao esporte bretão. Como se o cadarço da sua chuteira fosse uma espécie de cordão umbilical que liga o craque a mãe. A bola. Bola de papel, de meia, de couro, de capotão, de material sintético, não importa. Todas mães não são iguais? Pois é, todas bolas são iguais. Elas adoravam ser tocadas pelo Fenômeno. Assim como as redes adoravam estufar com as bolas que saíam dos pés de Ronaldo.
É apenas um texto de um apaixonado por futebol, por bom futebol. Quem não gosta desse esporte pode não entender a grandeza do dia de hoje. Não é apenas mais um jogador pendurando a chuteira. Não é apenas mais um que se aposenta com o bolso cheio de dinheiro que ganhou em um esporte em que 22 sujeitos correm atrás de um objeto esférico. Não. É a encarnação de um brasileiro que saiu da favela como muitos outros nesse esporte, mas que conquistou o respeito do mundo, e levou com humildade o nome do Brasil para os que não acreditam nesse país. É a realização da esperança nos jovens que se veem nesse ídolo. Ídolos que o Brasil tanto sente falta. É a perseverança que se mostra mesmo depois de quase todos dizerem que você está acabado. Mesmo após oito cirurgias.
Há um lance apoteótico que traduz toda capacidade desse homem. O primeiro gol na final da Copa de 2002. Ronaldo perde a bola em um lance de perigo para o Brasil, quase tropeça e o zagueiro alemão tira, ele fica no chão. Não o tempo suficiente para mostrar que estava certo quem dizia que ele estava acabado. "Num tapa", como diria meu avô, ele se levanta, corre em direção a sua amada, a toma do zagueiro e entrega para Rivaldo. Este sem titubear ajeita com a esquerda e bate. Kahn, o "jogador da Copa", o grande trunfo da Alemanha, bate roupa na linguagem do futebol e por um instante a bola fica orfã em frente ao gol. Primeiro esperando um contato para depois enfim encontrar a rede. O Fenômeno que a pouco caía, agora empurrava com carinho sua amada para o gol. Do chão à apoteose, como dito. Rrrrrrrrrronaldo gritou o Brasil.
Ele ainda me deu o prazer de vê-lo jogar em campos brasileiros, no meu time, marcando gols inesquecíveis que contarei aos meus netos em algum domingo, em uma final de Copa.
Hoje, o maior artilheiro das Copas, será recepcionado no Pantheon do futebol por outros gênios: Pelé, Maradona, Zico, Zidane, Garrincha, Di Stéfano, Puskas, Yashin, Cruijff, Beckenbauer...
Quando o apito soar só poderei agradecer por ter visto um dos maiores de todos os tempos. Suas arrancadas, dribles, chutes e passes ainda estão em nossas retinas, mas principalmente, não esqueceremos de como ele caía e se levantava. 
Segue o jogo.
Obrigado, Ronaldo! Obrigado, Ronaldinho! Obrigado, Fenômeno! Obrigado, gordo!